quarta-feira, 13 de abril de 2016

DE JACOB ZUMA a JULIUS MALEMA



 Quando cheguei a Pretória, em 2006, a África do Sul ainda era um mar de rosas. Eu pensava assim, mas com o passar dos tempos, fui mudando de opinião. As rosas foram murchando. Jacob Zuma enfrentava um processo de corrupção. Deixara de ser vice-presidente. E os seus apaniguados acusavam Thabo Mbeky de ter montado a cabala. Dois anos depois, vira-se o feitiço contra o feiticeiro. Polokwane é local para o “derrube” de Mbeky. Zuma passa a ser o novo “comandante”.

Malema era o controverso. Dava uma no cravo e outra na ferradura. Defendia pobres e injustiçados. Apoiava os mineiros e os trabalhadores rurais. Andava pelos campos a botar faladura, a prometer mundos e fundos, a falar mal dos que no Governo Mbeky esbanjavam, esquecendo-se que ele próprio fazia as orgias que fazia, a partir da sua mansão de Sandton, um dos mais nobres, chiques e ricos bairros da África do Sul. De mais falar do que fazer, Julius Malema acabou por ficar sem a sua árvore das patacas.



Julius ganhou fama na política exactamente por ser controverso. Defendeu o ANC com unhas e dentes. O ANC de Mandela, de Mbeky e de Zuma. Depois, dissociou-se deste último. Largou o Partido. Agora despeja todo esse ódio sobre Jacob, enquanto membro e principal mentor dum grupo político com assento parlamentar que dá pelo nome de Lutadores pela Liberdade Económica.

Nestes tempos conturbados duma África do Sul que começa a ficar (quase) num beco sem saída, como resultado dos escândalos de Zuma associados a outros factores duma ostensiva má governação, eis que Malema, polémico como sempre, aparece publicamente a dizer que We are worse than we were during the times of apartheid. We are being killed by our own people. We are being oppressed by our own government."

Estamos pior do que no tempo do apartheid. Estamos a ser mortos pelo nosso próprio povo. Estamos a ser oprimidos pelo nosso próprio Governo.

E esta hein? – diria o saudoso Fernando Pessa ! *


Fernando Pessa (1902 – 2002) foi o primeiro locutor da então Emissora Nacional (RDP/Antena1). Fez a primeira transmissão directa da RTP, a partir da Feira Popular, em Lisboa, e foi o primeiro português a ser repórter de guerra, ao serviço da BBC. Ficou célebre a expressão “e esta, hein?” com a qual fechava todos os seus trabalhos de reportagem.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

JURO

 Jurar significa declarar ou prometer solenemente. Geralmente invoca-se como prova de boa-fé, algo que se considera sagrado.

Jura-se por tudo e por nada. Jura-se por Deus. Pelas cinco chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela alma do pai ou pela alma da mãe.

Não perjurarás, mas cumprirás os teus juramentos ao Senhor. Eu, porém, vos digo que de maneira nenhuma jureis; nem pelo céu, porque é o trono de Deus; Nem pela terra, porque é o escabelo de seus pés; nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei; Nem jurarás pela tua cabeça, porque não podes fazer um cabelo branco tornar-se preto. Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna”. (Mateus 5:33-37).

Os juramentos selam, petrificam o que dizemos, de modo que quem diz algo sob juramento, deve cumprir o seu voto. Como o homem é falho, e comummente erra ou ao menos fica impossibilitado de cumprir aquilo que disse ou prometeu, não é conveniente jurar, pois, jurando, cai-se numa cilada, e o castigo é quase certo. Além disso, o homem que jura tem, muitas vezes, personalidade voltada para a mentira. Ele precisa de jurar para que acreditem nele.

Não jure à toa. Jurar é pecado … ainda bem para todos nós que um certo e macabro juramento (ainda) não se consumou.


quarta-feira, 23 de março de 2016

LEBOMBO






       Assim se chama a fronteira que leva o moçambicano à África do Sul. Por ali passam milhares de cidadãos, diariamente. Para ir à terra do “rand” fazer compras, para tratamento médico, para turismo ou para outros fins.

       Não incluo aqui a área de negócios, porque a este nível, a África do Sul começa a ser um chão com as uvas a minguarem cada vez mais. Aquilo que foi a referência económica de África, que bastas vezes se bateu com a Nigéria, entrou em colapso. Não só pelos efeitos da crise mundial, mas também pelo efeito de um sistema de governação que deixa muito a desejar.

       De cada vez que há um escândalo provocado por Jacob Zuma, (Nkandlhagate, nomeação de três ministros das finanças numa semana, envolvimento com a poderosa família Gupta que alegadamente estaria a nomear indivíduos para cargos de governação, etc …) a estrutura económica ressente-se de imediato. É o “rand” que entra em derrapagem e por via disso é o aperto que se faz sentir e que toca directamente no bolso do cidadão.



       A elite não se importa com isso, como é o caso dos deputados, porque a periclitante situação económica não lhes toca directamente. E mesmo que lhes toque, há sempre um “saco azul” que lhes permite fazer face aos problemas de descapitalização.  



São esses deputados que em vez de se preocuparem em satisfazer as necessidades básicas do cidadão, (água, energia, saneamento, rede escolar, assistência médica, segurança) debatem os seus salários como membros do Parlamento. Debatem e defendem com unhas e dentes, tal como aqui em Moçambique aconteceu, o aumento do vencimento mensal e de outras mordomias. 



       O curioso, na África do Sul, foi o debate do aumento de vencimento do Presidente Jacob Zuma. Aí, até os deputados do ANC (alguns, claro) votaram contra. Mas o voto contra não chegou para impedir o aumento salarial do mais alto magistrado da nação sul-africana. Ele ganha quatro milhões, trezentos e quarenta e seis mil randes por ano, o que significa 363 mil por mês, 83 mil por semana e 12 mil randes por dia.

       Zuma ocupa o primeiro lugar no “ranking” de 2015, dos presidentes mais bem pagos do continente africano. O segundo lugar da lista é ocupado pelo Chefe de Estado da Argélia, Abdulazize Bouteflika e o terceiro posto pertence ao Presidente do Kenya, Uhuru Kenyatta.

       Na África do Sul o vencimento do Presidente e demais membros do Governo é público. E por cá? Segredo de Estado?



sexta-feira, 18 de março de 2016

À DERIVA



Hoje parece que perdi o rumo. Perdi o Norte, como se costuma dizer.  

Deambulei pela cidade à procura de assunto para hoje. Não encontrei. Encontrei cada vez mais mendigos de mão estendida à procura da caridade de alguém que lhes dê alguns trocados. Os mesmos que às sextas-feiras deixam as esquinas demarcadas pelos semáforos e fazem fila à porta das lojas, à espera duma esmola.


Nos meus tempos de juventude, algumas destas coisas relacionadas com a mendicidade, eram acarinhadas por instituições ligadas à acção social, de entre as quais destaco o “Zé dos Pobres”, que até tinha direito a tempo de antena (15 minutos por semana) no então Rádio Clube de Moçambique. Hoje o Zé dos Pobres não existe, tal como já não existem muitas coisas mais, como por exemplo a “Caixa Escolar”.  



Neste meu deambular por aquilo que se designada de “cidade das acácias”, circulei pela baixa, na área próxima à Rua do nosso Major Araújo, hoje Rua de Bagamoyo. Vi vários locais para prostituição, a céu (quase) aberto, em plena luz do dia. No vão de alguns prédios situados na zona, taipais de madeira, ou até pequenos lençóis, encobrem uma relação de ocasião. Dizem-me que a Polícia sabe mas faz vista grossa. Onde chegamos? Para onde vamos? O que nos leva a chegar a este ponto?    
 

Na roda de amigos, fala-se de tudo um pouco. Da Renamo e da Frelimo e do jogo de empurra de ambos, interessados em perpetuar esta situação de tiro para lá, tiro para cá. E quem paga nesta situação é o pacato cidadão. 

 

Nas conversas que vou tendo com o meu grupo de amigos vem à baila o Desportivo de Maputo. Tema do dia: eleições naquela agremiação. Agora assiste-se a um vai que não vai, com alguns dos candidatos a presidente a dizerem que sim, não e talvez, ainda não é hora ou, preciso de me preparar melhor. E como se não bastasse um dos meus amigos contou-me a história da verdadeira “peixeirada” que foi a última Assembleia Geral dum clube de grande prestígio, fundado a 31 de Maio de 1931 e agora afundado em desgraças de todo o tamanho. Coitado do meu amigo Manuel Braga que, de quando em vez, tem de engolir alguns sapos.



E já agora que estou com a mão na massa, lá pelas bandas do café que frequento, e que me inspira muitas vezes para estes meus rabiscos semanais, cantou-se a “kalinka”, tema velhinho popularizado pelo exército vermelho da antiga União Soviética e por Ivan Rebroff, numa clara alusão à vitória das águias nos domínios de André Vilas Boas, que deixou os citadinos amantes do futebol de São Petersburgo, a cidade que já foi Petrogrado e Leningrado, de boca aberta. Depois desse desaire, imaginem como ficaria (se lá estivesse) o Czar, Pedro O Grande. Ficaria pequenino certamente.



E agora desculpem-me porque não tenho tempo para mais nada. Preciso urgentemente de me deslocar à Electricidade de Moçambique para lhes informar que a minha geleira “pifou” por força da eficiência no fornecimento normal de energia aos cidadãos deste País, traduzida por cortes constantes sem aviso prévio.

Disseram-me que eles pagam pelos danos causados. Espero bem que sim. Mas por causa das coisas, eu acho que o melhor é esperar sentado.


quarta-feira, 9 de março de 2016

O COMENDADOR





Quando foi estudante e depois escuteiro lá para os lados da Polana, e quando depois foi desportista de eleição, tendo para o efeito dedicado uma grande parte da sua juventude e adolescência ao seu Desportivo e ao basquetebol em particular, o meu amigo Zé nunca pensou que alguma vez poderia ser chamado de “senhor comendador”.

 

Quem o conhece sabe que ele não faz gala disso. Nem tão pouco se importa com as honrarias que tal designação lhe possa oferecer.

Não é nem nunca foi daquele tipo de pessoa que se incha (como muitos que circulam por aí) só porque lhe atribuíram uma função, um cargo ou outra coisa qualquer. Não gosta nem nunca gostou de demonstrar os seus dotes, ou de se gabar em público (gabarolas é o que há por aí aos montes), inventando histórias sobre coisas que fez ou deixou de fazer.

No meu amigo Zé simplicidade é uma palavra sagrada. Foi assim que sempre o conheci e é assim que sempre vai ser.

Ele sabe que, como comendador, tem o seu nível de responsabilidade. E essa responsabilidade foi sendo construída quando, um desaire na vida lhe provoca danos físicos, em pleno período do cumprimento do seu serviço militar.

A deficiência visual e a ausência dum braço, nunca foram impeditivo para que o meu amigo Zé se dedicasse, de alma e coração, aos projectos que sempre abraçou e executou com abnegação e saber.

Na Associação dos Deficientes das Forças Armadas, (em Portugal) onde desenvolve a sua actividade como Presidente desta Instituição, o “laurentino” Zé é um caso raro de mérito, de trabalho, de persistência, de competência e de amor pelo próximo, como diria o José da Costa (Casquinha), um dos seus companheiros do basquetebol de tempos bem recuados.

Parabéns José Arruda por mais um mandato. Que as experiências de 1987 a 1995 e as subsequentes, sirvam de exemplo e constituam a plataforma para mais realizações a favor daqueles que, por força dum infortúnio, passaram a saber conviver (e duma forma sã) com esse estatuto de DEFICIENTE.

Aquele abraço.